O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

15 setembro, 2008

O que é feito “daquele” PSD?

A política portuguesa dos últimos 10 anos tem sido flagrantemente pobre em ideias e objectivos e os maiores partidos parecem cortar pela raiz a hipótese do aparecimento de líderes novos com pontos de vista modernos e actualizados, e com projectos com cabeça, troco e membros que funcionem a longo-prazo. Esta última legislatura é o exemplo mais óbvio disso mesmo. A oposição não consegue encontrar um líder à altura (que não é muita) de José Sócrates e tende a procurar esse líder na “velha guarda”, desprezando quem tenta aparecer pela primeira vez. Para quem tem entre 20 e 30 anos de idade, ver estas pessoas repetitivamente já começa a dar alguns “enjoos”, o que resulta numa desacreditação e num afastamento generalizado da discussão política.

O recente e muito esperado discurso (apenas por ter demorado tanto tempo a acontecer) de Manuela Ferreira Leite na “Universidade de Verão” foi uma desilusão completa e o culminar desta falta de ideias. Note-se que com isto estamos a criticar um partido que se enquadra um pouco na nossa ideologia política, mas não estamos, com toda a certeza, a defender o PS – o nível é baixo em todos os partidos.

O que Ferreira Leite argumentou na sua palestra não passou de (i) críticas ao modo como o Governo lida (e controla) a comunicação social, algo que não parece ser relevante dado que ela própria foi o centro das atenções nesse fim-de-semana (sem fruto algum); (ii) dizer que o Governo só faz “espectáculo” – quem está no poder tem tendência a fazer espectáculo e isso não é relevante desde que faça o seu trabalho com competência; (iii) falar no sentimento de insegurança e na impunidade dos criminosos – não ouvimos soluções para este problema…; (iv) os resultados da governação são medíocres – é verdade, mas as propostas que Manuela Ferreira Leite apresenta ainda são piores, dado que não existem ou são cópias do que já foi proposto no passado e não funcionou.

Não existe uma solução mágica para os problemas que o país e a Europa passam, no entanto, só com pessoas de qualidade se pode evoluir politicamente dentro de cada país e depois na Europa como um todo. O Governo tem falhado em muitas áreas mas tem um trunfo para continuar a falhar com toda a legitimidade em 2009: não há adversários à altura. As pessoas estão desanimadas e os partidos podiam aproveitar essa situação para lançarem ideias ambiciosas e gerarem um movimento de mudança na sociedade. Não é isso que acontece no PSD nem no PS (que já não é um partido “socialista”). Apenas a extrema-esquerda aproveita estas fragilidades, com a sua hipocrisia e soluções milagrosas que parecem vir dos céus – parecem ser os “iluminados”. Só em países pouco desenvolvidos se assiste a isto. O PSD tem que ser mais inteligente e “atacar” onde existem mais fragilidades, sem deixar escapar o seu maior leque de eleitores: os empresários, sejam grandes, médios ou pequenos e os trabalhadores que os acompanham, e todos aqueles que acreditam que a evolução da sociedade vem do trabalho e desenvolvimento individual de cada um de nós à sua própria maneira.

Publicado no Jornal de

01 setembro, 2008

Fazer as Contas. Sem Erros.

O mês de Setembro talvez seja, para a grande maioria dos portugueses, um mês de fazer contas. As promoções e os saldos, as férias e os gastos adicionais que o verão acarreta levam-nos, inevitavelmente, a fazer contas à vida por esta altura. Atendendo aos números divulgados pelo INE e pelo BdP, há ainda a somar as prestações dos mais variados empréstimos: habitação, automóvel, férias ou consumo.

Não obstante, a realidade empírica parece um pouco contraditória: numa altura em que o índice de confiança dos consumidores está no valor mais baixo de há 22 anos (cifrando-se nos -47,2 p.), os portugueses mantêm um ritmo de consumo significativo, muito dele baseado no crédito. O parque automóvel português é um bom exemplo de como a expressão “Crise? Qual crise?” faz todo o sentido. Segundo a ACAP, as vendas dos automóveis de luxo cresceram 63,4% em 2006, enquanto que os veículos do segmento económico registaram 51,6% de aumento. Tal evolução positiva foi sustentada pelas marcas Mercedes, Jaguar, Austin Martin e BMW. De qualquer forma, um olhar mais atento aos automóveis que circulam nas nossas estradas permite confirmar tal facto. É verdade que muitos automóveis, sobretudo das marcas BMW, Mercedes e Audi, são importados, mas é notória a quantidade de automóveis com preço acima de 40.000 euros. Em acréscimo, a conjuntura económica não ajuda: fraco crescimento do PIB, elevado desemprego, forte inflação, preço do petróleo superior a anos anteriores – o que levará a que as famílias portuguesas percam novamente poder de compra.

Nada disto pareceria estranho se vivêssemos noutro país que não Portugal. Por isso, tudo leva a crer que vivemos acima das nossas possibilidades: o salário médio ronda os 1.069 euros e o aumento médio do salário ajustado pela inflação foi de 0,2% em 2007 (aumento positivo mais baixo dos países da UE). Ademais, o nível de endividamento, que actualmente se regista nos particulares, ronda os 129%. Tal reflecte-se no crédito malparado, o qual atingiu o nível mais alto de sempre, tendo crescido 11% no total do valor das cobranças duvidosas registadas pelos bancos. A Deco afirmou que mais de metade das famílias que não conseguem pagar os seus empréstimos tinham entre 3 a 10 empréstimos.

Como facilmente se compreende, a situação não é sustentável a longo prazo. Não é qualquer pecado ter uma casa confortável, um bom carro e passar férias num sítio paradisíaco. Não é pecado e é até algo positivo. O que não parece razoável é possuir tudo isso sem que, efectivamente, se os possa possuir. O facto de pertencermos à União Monetária Europeia abriu oportunidades a Portugal e permitiu-nos ter taxas de juros a níveis historicamente baixos. Isso, seguramente, conduziu-nos a um facilitismo na obtenção de crédito que nos levou hoje para além das nossas possibilidades.

A melhor solução é fazer as contas. Antes de, por exemplo, realizar um empréstimo para as férias nas Caraíbas a pagar em 4 anos, fazer o cálculo das prestações permitirá perceber que acabará por pagar mais do dobro. Coisas simples que resolvam problemas tendencialmente complicados. “É só fazer as contas”, diria António Guterres, esquecendo-se de acrescentar: “mas sem erros”.