O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

01 setembro, 2008

Fazer as Contas. Sem Erros.

O mês de Setembro talvez seja, para a grande maioria dos portugueses, um mês de fazer contas. As promoções e os saldos, as férias e os gastos adicionais que o verão acarreta levam-nos, inevitavelmente, a fazer contas à vida por esta altura. Atendendo aos números divulgados pelo INE e pelo BdP, há ainda a somar as prestações dos mais variados empréstimos: habitação, automóvel, férias ou consumo.

Não obstante, a realidade empírica parece um pouco contraditória: numa altura em que o índice de confiança dos consumidores está no valor mais baixo de há 22 anos (cifrando-se nos -47,2 p.), os portugueses mantêm um ritmo de consumo significativo, muito dele baseado no crédito. O parque automóvel português é um bom exemplo de como a expressão “Crise? Qual crise?” faz todo o sentido. Segundo a ACAP, as vendas dos automóveis de luxo cresceram 63,4% em 2006, enquanto que os veículos do segmento económico registaram 51,6% de aumento. Tal evolução positiva foi sustentada pelas marcas Mercedes, Jaguar, Austin Martin e BMW. De qualquer forma, um olhar mais atento aos automóveis que circulam nas nossas estradas permite confirmar tal facto. É verdade que muitos automóveis, sobretudo das marcas BMW, Mercedes e Audi, são importados, mas é notória a quantidade de automóveis com preço acima de 40.000 euros. Em acréscimo, a conjuntura económica não ajuda: fraco crescimento do PIB, elevado desemprego, forte inflação, preço do petróleo superior a anos anteriores – o que levará a que as famílias portuguesas percam novamente poder de compra.

Nada disto pareceria estranho se vivêssemos noutro país que não Portugal. Por isso, tudo leva a crer que vivemos acima das nossas possibilidades: o salário médio ronda os 1.069 euros e o aumento médio do salário ajustado pela inflação foi de 0,2% em 2007 (aumento positivo mais baixo dos países da UE). Ademais, o nível de endividamento, que actualmente se regista nos particulares, ronda os 129%. Tal reflecte-se no crédito malparado, o qual atingiu o nível mais alto de sempre, tendo crescido 11% no total do valor das cobranças duvidosas registadas pelos bancos. A Deco afirmou que mais de metade das famílias que não conseguem pagar os seus empréstimos tinham entre 3 a 10 empréstimos.

Como facilmente se compreende, a situação não é sustentável a longo prazo. Não é qualquer pecado ter uma casa confortável, um bom carro e passar férias num sítio paradisíaco. Não é pecado e é até algo positivo. O que não parece razoável é possuir tudo isso sem que, efectivamente, se os possa possuir. O facto de pertencermos à União Monetária Europeia abriu oportunidades a Portugal e permitiu-nos ter taxas de juros a níveis historicamente baixos. Isso, seguramente, conduziu-nos a um facilitismo na obtenção de crédito que nos levou hoje para além das nossas possibilidades.

A melhor solução é fazer as contas. Antes de, por exemplo, realizar um empréstimo para as férias nas Caraíbas a pagar em 4 anos, fazer o cálculo das prestações permitirá perceber que acabará por pagar mais do dobro. Coisas simples que resolvam problemas tendencialmente complicados. “É só fazer as contas”, diria António Guterres, esquecendo-se de acrescentar: “mas sem erros”.