O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

01 julho, 2008

Educação Contraditória?

Os resultados das provas de aferição aos alunos dos 4º e 6º anos de escolaridade foram recentemente divulgados pelo Ministério da Educação (ME): 18,3% dos alunos teve “Não Satisfaz”, enquanto que no ano passado 41% chumbaram na prova. Ou seja, as negativas caíram para menos de metade. Apenas 1,8% obteve a nota mais baixa (nível E), face aos 6,6% de 2007. Esta evolução parece fabulosa. Num país onde se diz que a Matemática, por exemplo, é um “quebra cabeças”, saber que 90% dos alunos do 4º ano e 85% dos alunos do 6º ano tiveram nota positiva parece algo contraditório. Apetece até perguntar se estamos mesmo em Portugal.

Um olhar mais crítico leva-nos ainda a perguntar: porquê esta melhoria de resultados nos 4º e 6º anos de escolaridade? Uma primeira hipótese, muito pouco convincente, será dizer que os alunos nascidos em 1997 e 1999 são melhores alunos do que os nascidos em 1996 e 1998. Uma segunda, à qual o Governo recorreu, baseia-se na afirmação de que foi o esforço do ME ao longo destes últimos 2/3 anos que permitiu atingir estas melhorias. Que fosse possível atingir melhorias, julgo que estamos de acordo. Mas menos de metade de negativas de um ano para o outro? Média de 90% de positivas? A última hipótese é dizer que os exames terão sido menos exigentes, por forma a que os alunos tivessem melhores notas. O próprio Presidente da Associação de Matemática, Nuno Crato, afirmou temer um “facilitismo progressivo” ao nível dos critérios dos exames. De facto, das três alternativas, esta parece ser a mais convincente para explicar esta súbita melhoria de resultados: menos exigência no conteúdo, um maior facilitismo nas questões colocadas e maiores proveitos políticos para o Governo.

De qualquer forma, Portugal não sobreviverá hoje como uma ilha isolada, considerando a sua integração num mundo globalizado. Assim, parece-nos que pouco interessam os nossos resultados internos, se não tivermos em consideração os dos outros países. O inquérito PISA (referência ao de 2006), que consiste em exames realizados a alunos dos países da OCDE com incidência nas áreas de literacia cientifica, literatura e matemática, revelou como Portugal está atrás dos demais países. Na literacia científica, para a média de 500 da OCDE, Portugal possuía 474 pontos, tendo evoluído de 28º para 27º em 30 países de 2003 para 2006. Na literatura, obteve uma média de 472 contra os 500 pontos da OCDE e evoluiu de 27º em 2003 para 24º em 2006. Na matemática, a média é de apenas 466 pontos, abaixo da OCDE, e tanto em 2003 como em 2006 Portugal ocupava o 26º lugar em 30 países.

São resultados que mostram uma realidade relativa muito mais importante que a absoluta revelada pelas provas de aferição. Além disso, os exames PISA são puramente independentes e iguais em todos os países. Provavelmente, o ME diria que “hoje” os resultados PISA em Portugal iriam melhorar 50%, se fossem realizados com estes alunos... Entendemos que em vez de continuar iludir as pessoas, é papel do Governo procurar resolver problemas estruturais da educação, em vez de passar a ideia de que tudo está bem quando isso não corresponde à realidade. Todos sabemos que, cegamente conduzidos ao abismo, um passo em frente não nos faz subir, mas sim cair de vez.