O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

01 janeiro, 2009

Perspectivas para 2009

Chegados a mais um fim de ano, as atenções viram-se para o novo tempo que nos espera. Mais importante do que fazer um balanço será pensar no que o Pai Natal nos reserva para 2009. Repetidamente ouvimos dizer que será um ano duro; um ano pior do que 2008. Há alguns anos que somos abençoados com este fantasma que parece pairar sobre nós: será um ano difícil, os portugueses “terão de apertar o cinto”, é altura de contenção... No entanto, olhando para trás poderíamos cometer o erro de dizer que houve apenas alarmismo. Veja-se como o consumo se manteve em níveis elevados.

Importa mencionar é que o conseguimos à custa do endividamento das famílias. E que o país continua cada vez mais endividado ao exterior. Engane-se quem pense que o Governo, de um momento para o outro, abanou uma “árvore das patacas” até agora escondida, para presentear o mercado com ajudas financeiras. O que se pede emprestado para usufruir hoje, amanhã paga-se.

E este será, sem dúvida, o que o futuro nos reserva: o pagamento. Até aos dias de hoje temos usufruído do que pedimos emprestado para as mais banais coisas (desde a compra de automóvel de luxo, ao consumo supérfluo – sempre que acima das possibilidades de cada um). Quando ouvimos nas notícias que o endividamento das famílias é quase de 130% do valor do rendimento de global, é óbvio que isto só é possível se alguém emprestar a diferença entre os 100% e os 130%, mais aquilo que os bancos têm que ganhar em margem de lucro e pelo risco a que se sujeitam. Ora, este diferencial tem sido constante nos últimos anos e todos os dias os bancos compram dinheiro a outros mercados para o emprestarem às pessoas e às famílias. Agora que “não há” liquidez, ou seja, não há dinheiro disponível, só há números em activos e passivos que ninguém arrisca comprar, as famílias/empresas terão que pagar os seus empréstimos para que os bancos também o possam fazer. Isto significa que, ao mesmo tempo, a emissão de créditos fica mais difícil de obter por parte das empresas e das famílias. Conclusão: menos consumo e menos investimento, que resultam em menos produção de riqueza nacional. Resumidamente, 2009 reserva-nos o início do pesadelo: pagar o que nunca pudemos ter com aquilo que não temos.

Estaremos a ser novamente demasiado alarmistas? O Primeiro-Ministro lembrou recentemente que as famílias portuguesas vão ter um melhor rendimento disponível em 2009 devido às baixas conjugadas da taxa de juro, do preço dos combustíveis e do aumento anunciado dos salários. Esqueceu-se apenas de mencionar que isso só acontecerá para as famílias que não ficarem desempregadas.

As empresas portuguesas, sobretudo a dos sectores mais expostos à actual crise (salienta-se o automóvel, ou o têxtil) vão ser forçadas a reduzir a produção. Essa redução implicará, inevitavelmente, despedimentos – que terão impactos significativos nos rendimentos de muitas famílias. Esta situação tende a agravar-se, agora que as empresas começam a enfrentar sérias dificuldades para se aguentarem.

Estamos de acordo que é positivo transmitir esperança às pessoas; o problema é quando esse acto revela uma tentativa oculta de manipulação, porque o prometido acaba por não ter fundamento sólido. A possibilidade de Portugal entrar em recessão é agora real, ainda mais que o nosso pequeno país está dependente de um mundo globalizado (para o bem e para o mal). Dizer que a crise acabou, antes de ela sequer ter começado, foi um tiro no próprio pé deste Governo. O mais importante é que em 2009 se fale verdade, que se acabe com as politiquices a que já nos habituamos e que se crie uma consciência nacional da realidade que enfrentamos – seja de que maneira for, todos vamos ser afectados na negativa. Resta-nos evitar colapsos sociais de curto prazo e tentar aproveitar as oportunidades que surjam nesta altura, para que daqui a uns dois anos o motor da economia seja novo (e diferente) e estejamos a crescer novamente mas, desta vez, “a todo o gás”. Caso contrário continuaremos a cavar fundo na esperança de encontrar um tesouro que não existe, sem nos apercebermos que, simplesmente, estamos a cavar a nossa própria sepultura.