O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

15 dezembro, 2007

Cidades Sustentáveis

Sendo verdade que as questões ambientais devem merecer a nossa atenção, não é menos verdade que elas não encerram os problemas que as sociedades contemporâneas enfrentam.

O desperdício, por exemplo, representa uma preocupação constante a ter. Como se sabe, os bens são escassos e essa é uma realidade que temos que internalizar. O assunto que aqui trazemos para análise assenta nesta realidade e tem a ver com saber se as cidades dos dias de hoje são sustentáveis, i.e., cidades capazes de responder eficazmente a elevadas exigências para que não comprometam as gerações futuras.

Uma cidade sustentável deve ser entendida como sendo uma cidade organizada de modo a tornar todos os seus cidadãos capazes de satisfazerem as necessidades e de melhorarem o seu bem-estar sem, como se disse, prejudicar o mundo natural e colocar em causa as outras pessoas, agora e no futuro.

Existe uma série de dados conhecidos que, sendo alarmantes, não deixam de ser curiosos: as cidades representam 2% da superfície terrestre e consomem 75% dos recursos; em 35 anos cerca de 33% do mundo natural foi aniquilado. Mas a verdade é que as cidades actuais possuem infra-estruturas obsoletas, qualidade de energia e água em declínio. Em Londres perde-se milhares de galões água por dia que davam para encher 10 milhões de banheiras; em Nova Iorque cerca de 100 mil de pessoas estiveram 9 dias sem electricidade, porque os cabos que a transportavam tinham 30 a 60 anos de idade. De facto, todas as grandes cidades, com grande concentração populacional e empresarial, têm problemas semelhantes ao nível da electricidade, transportes e água.

Estima-se que no futuro cerca de 1500 milhões de pessoas enfrentem ambientes ameaçadores para a sua vida e saúde. O crescimento mundial será de 8 mil milhões de pessoas em 2050, sendo que 50% se registará em áreas metropolitanas. Mas a questão é que se nada se fizer, o custo a suportar no futuro poderá ascender a 40 triliões de dólares. Actuando hoje e durante os próximos 25 anos, o custo rondará (apenas!) os 40 biliões de dólares.

Neste contexto, a questão que hoje devemos colocar é se somos capazes de responder a tais exigências. Estarão as nossas cidades em capacidade para, como grandes centros populacionais que são, permitirem tal feito? Que soluções para, por hipótese, reduzir o desperdício? Entre elas contam-se promover políticas de urbanização, estabelecer tarifas que variem consoante os picos de consumo (desencorajando-o), realizar investimentos urbanos responsáveis, ou adoptar abordagens inovadores de financiamento, governança e gestão. Como sempre, o poder está nas nossas mãos. Trata-se de fazer o melhor uso dele.

Publicado no Jornal de

01 dezembro, 2007

Optar pela Comunicação Social

No início do mês de Novembro, algumas estações de televisão passaram uma peça sobre uma funcionária pública de 43 anos que estava de baixa há cerca de três anos devido a uma operação cirúrgica mal sucedida, a qual a deixou fisicamente limitada. Como um mal nunca vem sozinho, a mesma senhora foi notificada pela Caixa Geral de Aposentações (CCA) para se apresentar ao serviço.

Obrigada a usar uma colar cervical, uma braçadeira e uma cinta lombar, a senhora está hoje completamente dependente de terceiros. Segundo a própria, é incapaz sequer de “virar uma página” sem ajuda. Em Fevereiro de 2006, a Junta Médica da ADSE considerou-a incapacitada para o trabalho, embora a CCA de Viana do Castelo a tivesse declarado “muito nova para a reforma” e, portanto, capaz de exercer as suas funções.

O caso chocou a opinião pública. De facto, dias após a peça ter sido exibida e difundida por outros meios de comunicação, a senhora recebeu indicação contrária. Com a intervenção de representantes do Governo e das autoridades competentes, as quais manifestaram compreensão e asseguraram que houvera um mal-entendido, a situação resolveu-se.

Cabe, evidentemente, às entidades de direito assegurar que situações como estas não aconteçam. O que nos parece grave é que isso não aconteça. Ou seja, o Estado (e todas as entidades que actuam sobre a sua alçada) que deverá salvaguardar os cidadãos e os seus direitos, não é (também nisto) capaz de intervir eficazmente na sua esfera de influência. E o que dizer das pessoas da CCA que notificaram a senhora a comparecer ao trabalho? Sejamos francos: não parece ser necessária muita sabedoria para avaliar a capacidade, ou incapacidade, da senhora em causa para exercer as suas funções. Tanto isto assim é, que logo o problema se resolveu. Mas resolveu-se apenas através da comunicação social.

A própria chegou a participar a sua situação à Procuradoria-Geral da República, a qual a aconselhou a defender os seus interesses pelas vias judiciais, não tendo dado atenção ao facto de se tratar de uma família de parcos recursos. Mas resolveu bem a situação: não podia ir a tribunal, foi à comunicação social: custo zero, eficiência máxima. Será esta a ideia de justiça que temos? A verdade é que todos os portugueses têm igualdade de oportunidades no que concerne à Justiça, mas não têm igualdade no seu acesso. Isto faz-nos lembrar uma ‘anedota’: a diferença entre uma pomba e um poste é que ambos voam, excepto o poste. Voltando à Justiça: a diferença entre um pobre e um rico é que ambos podem usufruir dos Tribunais, excepto o pobre. A dita igualdade não passa, portanto, de um mero chavão.

No meio deste triste acontecimento, há pelo menos uma lição a reter: sempre que tiver algum problema de índole semelhante, não “meta” o Estado em Tribunal; “meta-o” na comunicação social. Não é por acaso que é apelidada de “quarto poder”. Vai ver que o resolve com uma relação custo-beneficio mais favorável.