O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

15 janeiro, 2009

Transformar a Grande Crise num Futuro Melhor

Tem-se falado exaustivamente sobre o facto de 2009 vir a ser o ano da “grande crise”. Ainda maior do que aquela que os portugueses já sofrem desde 2001, quando Guterres fugiu pela “porta do Cavalo” e deixou o país de “tanga”, a ser sucessivamente Governado também de forma errada, sem que se pensasse no futuro e prometendo-se impossíveis sem qualquer base de sustentação.
Mas quer a crise seja em 2009 ou noutro ano, de duas, uma: ou o barco se afunda completamente e vamos para a pesca como os Islandeses, ou vamos percorrer um longo e doloroso caminho de jangada, à chuva e ao vento. Depois de sofrermos uma destas duas hipóteses há a oportunidade lógica e óbvia de se passar a fazer as coisas bem e de construir um país (ou uma Europa, se for o caso) com cabeça, tronco e membros. Porque é que quase nunca os eleitores pensam no país como a maioria das pessoas pensa nos seus filhos: no futuro. Os pais passam meia vida, no mínimo, a educar um filho para que ele viva bem quando atingir a idade adulta. O país (onde moramos nós e os nossos filhos…) é gerido a curto-prazo apenas para o prazer de quem Governa. No fundo, os eleitores contratam babysitters quando já sabem que elas vão transformar a vida do seu filho num caos. É claro que ninguém valorizara tanto o país como um filho, mas a analogia aqui feita serve para mostrar como somos brandos com o nosso próprio futuro, só porque ele não está directamente nas nossas mãos (vota-se num papel e já está, não se pensa muito mais nisso). Só quando a crise aparece é que nos queixamos e começamos a ver os frutos que colhemos das decisões que tomamos há uns anos. Mas acalme-se o leitor porque a culpa também recai sobre a babysitter, que é incompetente mas sabe vender bem o seu fraco produto, anunciando-o sempre como se fosse milagroso… Culpas ali ou acolá não resolvem problemas, todavia podem evitar que se cometam os mesmos erros no futuro.
Para começar já a preparar esse futuro não é inteligente aceitar que se façam obras como o TGV e o aeroporto de Lisboa, duas obras muito úteis num país que esteja bem economicamente, mas não quando as bases da economia se estão a desfazer. O desemprego que todos apregoam para 2009 será um drama social e um sofrimento enorme para cada uma das famílias que o encontrar, mas não significa apenas isso. O desemprego é o rosto visível de algo muito pior: a ruína das empresas. Porquê? Será só porque os accionistas ou os donos (gente malvada para muitos) vão perder dinheiro? Por um lado também, pois foram eles que fundaram/compraram as suas empresas. Mas sobretudo e mais do que tudo porque por cada empresa que fecha, um outro conjunto de empresas tende a falir (e as pessoas a sofrerem ainda mais). E isso é irrecuperável. A base de uma economia não são as grandes empresas. Essas representam o auge da economia e são aquelas que na maioria das vezes criam novas tecnologias, novas ideias e permitem que vivamos cada vez com mais conforto, desenvolvimento e mais conhecimento. As pequenas e médias empresas (PME’s), fruto da iniciativa de indivíduos com coragem e vontade de crescer à sua custa são as empregadoras da maioria das pessoas e o seu conjunto é uma fonte de riqueza enorme para a sociedade. Com as PME’s a crescerem, toda a economia as acompanha nesse sentido – a classe média predomina e vive bem.
É urgente apoiar quem quer inovar, criar empresas e emprego. A oportunidade de que falamos só será possível se começar por esta base. O papel do Governo não deve ser o de gastar o dinheiro que já não tem com investimentos que não fazem sentido (já nem nos querem emprestar dinheiro com a garantia do Estado… o Estado tem uma dívida pública abismal e não há riqueza a ser gerada que possa diminui-la…). O TGV vai ser pago com o dinheiro de quem? E vai andar sem passageiros? O aeroporto de Lisboa vai ficar às moscas? As empresas (e trabalhadores) que os construírem vão fazer o quê depois? A construção dura uns anos, mantém umas centenas de empregos, é concluída e depois ficamos todos a olhar para a obra feita com os bolsos vazios. O Governo, e isto já o dissemos várias vezes, deve investir na educação dos jovens e (de forma distinta) na dos adultos. A base da economia já não pode ser de mão-de-obra barata, por isso temos que passar a ser “caros” e a conseguir cobrar por isso, criando produtos únicos, inventando empregos novos, prestando serviços de alta qualidade; tudo à base de conhecimento: fruto desse investimento na educação. Mas entretanto, e já que vivemos num espaço único no mundo, a União Europeia, porque não arriscar mais um pouco e em caso de desemprego ou trabalho precário, aprender uma língua, viajar com a família para um dos país da União e encontrar um emprego melhor e uma escola melhor para os filhos? Em muitos casos isto será possível e é uma forma vantajosa de diminuir os efeitos da crise e de preparar esse futuro melhor. Muito há para ser dito sobre o que mudar no nosso país e na nossa Europa e transformar a tal grande crise num futuro melhor. Esperamos estar a contribuir um pouco para essa mudança, cada vez que abordamos este assunto.

Um Ano Novo Optimista

Na sua mensagem de Ano Novo, o Presidente da República (PR) manifestou apreensão relativamente aos elevados salários auferidos por “altos dirigentes de empresas”. Apesar de concordarmos em geral com as ideias transmitidas, discordamos deste “falso” alerta e das consequências que tem na consciência dos portugueses.

É inegável que para a maioria da população activa, ganhar 5, 10 ou 25 mil euros mensais é absurdo e injusto face ao salário médio de um português. No entanto, há duas formas de ler estes números. A primeira, onde se insere a referência do PR, é de “vistas curtas”, irremediavelmente populista e demagógica. Considera-se que por os “altos dirigentes” usufruírem de tais regalias financeiras, toda a população paga por isso e tem cada vez menos poder de compra. Os gestores ocupam uma minoria de lugares que exigem pessoas altamente competentes e experientes, sendo alvo de grandes ofertas salariais por parte dos accionistas das empresas privadas, ou do Governo, no caso de empresas públicas. Sabemos que o PR referiu: “sem pôr em causa o princípio da valorização do mérito e a necessidade de captar os melhores talentos (...)”. Mas é precisamente esse princípio que está a ser posto em causa.

A outra perspectiva leva-nos a abordar esta questão da seguinte forma: porque ganham em média os portugueses tão pouco? Porque temos cada vez menos poder de compra em relação aos nossos vizinhos europeus?

O objectivo nacional não pode ser o de reduzir meia dúzia de salários àqueles que tentam dar vida às empresas; sabemos que em muitas empresas a gestão não é competente, mas, abordando a questão a médio-longo prazo, só os competentes sobreviverão. O objectivo tem de ser, isso sim, o de aumentar os salários médios dos trabalhadores, criando uma ampla classe média com desafogo económico. Isso só é possível com políticas construtivas, que apostem no desenvolvimento das pessoas e na criação de empresas modernas e competitivas, orientadas para o mundo e não apenas para duas ou três cidades e um arquipélago. E aqui o Governo deve intervir, apoiando quem cria novas tecnologias, quem se internacionaliza, ou quem cria postos de trabalho sustentáveis e aposta no desenvolvimento de cada colaborador. Continuar a ter parcos resultados na Educação, formando pessoas pouco qualificadas, e apostar no preço e não na qualidade dos produtos só ajuda a agravar a situação.

Entendemos que uma mensagem de Ano Novo deveria suscitar optimismo, vontade de mudar, alargar os nossos horizontes, dar um impulso para crescermos como povo, lutarmos e evoluirmos, em vez de alimentar choques infundados entre classes, desgosto pela situação presente e perda de esperança no futuro.

Publicado no Jornal de

02 janeiro, 2009

A Cenoura e os Burros

O decreto-lei aprovado pelo Governo de José Sócrates que permite a adjudicação directa (i.e., sem concurso público) de obras até 5 milhões de euros pelas autarquias foi a forma encontrada para se legalizar a corrupção como prática ilegal. Este é, seguramente, um passo gravíssimo.

Os contornos obscuros que o poder autárquico mantém com eventuais empresas ou indivíduos locais é um tema recorrente no nosso país. Ora o Governo em vez de tomar medidas que desincentivem à prática da corrupção, gera um efeito perverso ao permitir que as empresas de construção civil (as principais visadas) fiquem totalmente dependentes da boa-vontade do poder autárquico, do estado de espírito do executivo camarário no dia da aprovação da obra, da “oferta” de luvas (atitude simpática em altura de frio), ou de qualquer outro critério que nunca ninguém saberá.

Apesar de o Governo se defender com a intenção de promover a rapidez dos processos, a verdade é que é impensável que essa rapidez se faça em sacrifício da concorrência, da transparência e de um melhor serviço público. Obviamente, não é difícil antever que esta lei piore as condições oferecidas aos munícipes, os quais acabarão por pagar uma factura mais cara. A falta de transparência levará a uma pior gestão de dinheiros públicos, uma vez que a necessidade de adjudicação de uma obra não se impõe à empresa que ofereceu melhores condições. Pelo menos ao munícipes em geral...

Sendo verdade que a política assenta em princípios de seriedade e rectidão, não é menos verdade afirmar que somos portugueses. E, atendendo à nossa curta história de democracia pós-25 de Abril, está-se mesmo a ver que esta lei está para as autarquias como a cenoura para os burros: só não lhe mete os dentes aquele que não lhe chegar.

É um triste retrocesso num caminho para uma sociedade livre, de progresso e crescimento. A corrupção é um claro entrave à progressão de um país e o Portugal local é a face disso mesmo.

Publicado no Jornal de

01 janeiro, 2009

Perspectivas para 2009

Chegados a mais um fim de ano, as atenções viram-se para o novo tempo que nos espera. Mais importante do que fazer um balanço será pensar no que o Pai Natal nos reserva para 2009. Repetidamente ouvimos dizer que será um ano duro; um ano pior do que 2008. Há alguns anos que somos abençoados com este fantasma que parece pairar sobre nós: será um ano difícil, os portugueses “terão de apertar o cinto”, é altura de contenção... No entanto, olhando para trás poderíamos cometer o erro de dizer que houve apenas alarmismo. Veja-se como o consumo se manteve em níveis elevados.

Importa mencionar é que o conseguimos à custa do endividamento das famílias. E que o país continua cada vez mais endividado ao exterior. Engane-se quem pense que o Governo, de um momento para o outro, abanou uma “árvore das patacas” até agora escondida, para presentear o mercado com ajudas financeiras. O que se pede emprestado para usufruir hoje, amanhã paga-se.

E este será, sem dúvida, o que o futuro nos reserva: o pagamento. Até aos dias de hoje temos usufruído do que pedimos emprestado para as mais banais coisas (desde a compra de automóvel de luxo, ao consumo supérfluo – sempre que acima das possibilidades de cada um). Quando ouvimos nas notícias que o endividamento das famílias é quase de 130% do valor do rendimento de global, é óbvio que isto só é possível se alguém emprestar a diferença entre os 100% e os 130%, mais aquilo que os bancos têm que ganhar em margem de lucro e pelo risco a que se sujeitam. Ora, este diferencial tem sido constante nos últimos anos e todos os dias os bancos compram dinheiro a outros mercados para o emprestarem às pessoas e às famílias. Agora que “não há” liquidez, ou seja, não há dinheiro disponível, só há números em activos e passivos que ninguém arrisca comprar, as famílias/empresas terão que pagar os seus empréstimos para que os bancos também o possam fazer. Isto significa que, ao mesmo tempo, a emissão de créditos fica mais difícil de obter por parte das empresas e das famílias. Conclusão: menos consumo e menos investimento, que resultam em menos produção de riqueza nacional. Resumidamente, 2009 reserva-nos o início do pesadelo: pagar o que nunca pudemos ter com aquilo que não temos.

Estaremos a ser novamente demasiado alarmistas? O Primeiro-Ministro lembrou recentemente que as famílias portuguesas vão ter um melhor rendimento disponível em 2009 devido às baixas conjugadas da taxa de juro, do preço dos combustíveis e do aumento anunciado dos salários. Esqueceu-se apenas de mencionar que isso só acontecerá para as famílias que não ficarem desempregadas.

As empresas portuguesas, sobretudo a dos sectores mais expostos à actual crise (salienta-se o automóvel, ou o têxtil) vão ser forçadas a reduzir a produção. Essa redução implicará, inevitavelmente, despedimentos – que terão impactos significativos nos rendimentos de muitas famílias. Esta situação tende a agravar-se, agora que as empresas começam a enfrentar sérias dificuldades para se aguentarem.

Estamos de acordo que é positivo transmitir esperança às pessoas; o problema é quando esse acto revela uma tentativa oculta de manipulação, porque o prometido acaba por não ter fundamento sólido. A possibilidade de Portugal entrar em recessão é agora real, ainda mais que o nosso pequeno país está dependente de um mundo globalizado (para o bem e para o mal). Dizer que a crise acabou, antes de ela sequer ter começado, foi um tiro no próprio pé deste Governo. O mais importante é que em 2009 se fale verdade, que se acabe com as politiquices a que já nos habituamos e que se crie uma consciência nacional da realidade que enfrentamos – seja de que maneira for, todos vamos ser afectados na negativa. Resta-nos evitar colapsos sociais de curto prazo e tentar aproveitar as oportunidades que surjam nesta altura, para que daqui a uns dois anos o motor da economia seja novo (e diferente) e estejamos a crescer novamente mas, desta vez, “a todo o gás”. Caso contrário continuaremos a cavar fundo na esperança de encontrar um tesouro que não existe, sem nos apercebermos que, simplesmente, estamos a cavar a nossa própria sepultura.