O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

01 junho, 2006

O Capuchinho Vermelho em Algures

Era uma vez uma linda menina, a quem chamavam de Capuchinho Vermelho, que vivia numa bonita aldeia do concelho de Algures. Certo dia, o Capuchinho Vermelho foi visitar a avó. Caminhava pela floresta fora a cantarolar e a brincar com os seus amigos pássaros. Mas eis que o Lobo surge à sua frente:

- Onde é que vais, linda mocinha?

Como o Capuchinho Vermelho não sabia que era perigoso falar com os lobos, respondeu-lhe:

- Olá Sr. Lobo! Vou até casa da minha avozinha. Tenho um pão muito fresquinho e alguns bolos para lhe dar...

- E onde vive essa tua avozinha?

- É já ali, a primeira casa depois de passarmos a floresta.

O Lobo pensou uns instantes e perguntou:

- Queres fazer um jogo? Vamos ver quem é que chega primeiro a casa da tua avozinha! Eu vou pelo caminho da Esquerda e tu vais pelo da Direita. Queres?

Capuchinho Vermelho pensou que ia ser divertido e aceitou brincar com o Lobo. O que ela não sabia é que ele lhe tinha dado o caminho mais difícil. Assim, o Lobo conseguiu chegar mais rapidamente (ainda que de forma atabalhoada) à casa da avozinha do Capuchinho, para a fazer, também a ela, cair na sua laia.

Enquanto a menina percorria o seu caminho, o Lobo chegou a casa da avó e bateu à porta.

Truz-truz...

- Quem é? – perguntou a avozinha.

O Lobo esfregou as mãos de contentamento. Então, disse:

- É o Lobo! Posso entrar? Tenho emprego para a sua netinha e muito mais!...

- Cruzes!!! Então, entre, entre!

O Lobo entrou de rompante, “saltando” ferozmente sobre a pobre avozinha, “engolindo-a” nas suas tenebrosas manhas! De seguida, vestiu a roupa da senhora e esperou pelo Capuchinho. E eis que a menina bate à porta...

- Avozinha, sou eu!

- Entra minha netinha... – disse o Lobo, mudando a voz.

O Capuchinho Vermelho entrou e perguntou:

- Avozinha, o Sr. Lobo já chegou? Ele fez um jogo comigo, parece muito simpático...

- Não, ainda não chegou, mas realmente é muito simpático! O Lobo é muito nosso amigo e promete-nos muitas coisas boas!

- Ó avozinha, mas o Sr. Lobo já cá está à tanto tempo e nunca fez nada, a não ser coisas para a alcateia dele!

- Não digas isso netinha! É injusto! Toda a gente gosta dele e quer que ele continue responsável por Algures.

- Pois, realmente tens razão... – assentiu. - Mas, ó avozinha, que grandes braços tu tens!

E o Lobo respondeu:

- São como os do Lobo, minha netinha, para te poder abraçar melhor...

- E que pernas tão grandes!

- São como as do Lobo, para te apanhar melhor...

- E as tuas orelhas, que grandes que elas são!

- São como as do Lobo, para fazer de conta que te ouço melhor...

- Avozinha! E que dentes grandes tu tens!

- São como os do Lobo, minha netinha, para te comer melhor!

E o Lobo conseguiu “engolir” também o Capuchinho Vermelho na sua conversa trapaceira.

Satisfeito e sentindo-se seguro no poleiro, com uma enorme barriga, o Lobo achou-se na condição de descansar um pouco. Entretanto, o pai do Capuchinho Vermelho, caçador e corajoso opositor à devassidão dos lobos, ao passar à beira-rio, viu o Lobo com uma enorme barriga, de “papo para o ar”, com as costas apoiadas numa árvore, ressonando ruidosamente. Levantando o machado que trazia, preparava-se para o abater, quando ouviu uma voz que o parecia chamar da sua barriga:

- Socorro, socorro! Será que ninguém nos liberta destas manhas?

O caçador reconheceu a voz da filha e, com o machado, abriu a barriga do Lobo, salvando o Capuchinho Vermelho e a avozinha das suas obscuras entranhas. Depois, encheu-lhe a barriga com pedras e coseu cuidadosamente a abertura. Os três abandonaram o local, deixando o Lobo a dormir descansadamente.

Mais tarde o Lobo acordou e, ao pôr-se de pé, tombou por causa do peso que tinha na barriga.

- Estes não caíram lá muito bem... – resmungou, receando não ter conseguido ser muito convincente.

Cambaleando, dirigiu-se para a margem do rio na ânsia de beber água. Mas mal mergulhou o focinho no rio e deu o primeiro gole, caiu redondo, fulminado pela poluição da água, à qual – como responsável por Algures - nunca tinha dado especial atenção.

Moral desta história: se, como dizem, o gato não tem mais de 7 vidas, então, também o Lobo mau não tem.

FIM