O Bom Senso no Terras do Ave

* Aqui encontra os artigos publicados no jornal vilacondense, Terras do Ave, escritos pelos autores d' O Bom Senso: Luís Soares e Nuno Miguel Santos*

Os textos são aqui publicados duas semanas após a sua publicação no jornal.

O Bom Senso

Jornal Terras do Ave

Publicado no Jornal de

15 maio, 2006

Poder Votar “Abstenho-me”

O tema a que nos propomos desenvolver nesta edição é algo controverso e difícil de condensar no pouco espaço de que dispomos. Todavia, tentaremos ser claros e concisos.

A abstenção é uma (preocupante) realidade que paira sobre cada eleição em que os portugueses são “chamados” a votar. São apontadas, a grosso modo, duas causas para a sua existência, sendo que uma delas se prende com factores individuais e outra com factores institucionais. No primeiro factor incluem-se variáveis como a idade, a educação, o rendimento, o estado civil e o interesse pela politica ou a filiação num determinado partido. No lado dos factores institucionais estão abrangidas as variáveis como a facilidade e comodidade no acto de votar, obrigatoriedade do voto, incentivo ao voto e possibilidade de poder escolher as pessoas, dentro de um dado partido, candidatas às eleições (vulgo “directas”). Por outro lado, também se distingue “abstenção política” - fundamentada em opções conscientes dos indivíduos e de cariz estritamente político - de “abstenção não política” – que engloba todas as outras razões, desde a doença até às férias.

Independentemente desta exposição teórica, vamos, por momentos, considerar as eleições legislativas de Março de 2002. Segundo dados divulgados pelo STAPE a abstenção oficial foi de 37,2% (por norma, a abstenção oficial é superior à declarada nas sondagens, que no presente caso foi de 23,7%). Nessas eleições, três das principais razões declaradas para a abstenção foram o “desinteresse pela política” (32,5%), a “irrelevância do voto” (10,8%) e a “desconfiança ou insatisfação com os partidos políticos” (10,8%). Assim, parece fazer sentido perguntar: se a abstenção é uma opção legitima tomada por uma parte significativa da população e com razões relacionadas, na sua maioria, com as instituições, então porque não lhe é atribuída relevância política?

Este é pois o cerne da questão que colocamos à reflexão: da mesma forma que os partidos eleitos têm representação parlamentar em função dos votos obtidos, porque não tem também “a abstenção política” lugar no parlamento? Seria, pois, imprescindível um novo método que permitisse distinguir os eleitores que se abstêm por razões de ordem política e os que o fazem por outras razões. Um forma de contornar este problema seria criar nos boletins de voto uma opção denominada, por exemplo, “Abstenho-me”. Neste sentido, a população que votasse “Abstenho-me” estaria representava, em função da sua percentagem, em lugares do parlamento desocupados. Parece-lhe estranho? Mas não terão os abstencionistas razões de peso que justifiquem a sua “presença” (verem-se representados) na Assembleia da República Portuguesa (AR)?

Este novo modelo, ao contrário do que possa parecer, não poria em causa o normal funcionando da AR. Simplesmente, o número de deputados total do parlamento corresponderia aqueles que lá estivessem fisicamente presentes. A maioria parlamentar seria obtida por metade (+1) desse número de deputados. As outras cadeiras vazias apenas representariam aqueles indivíduos que escolheram, livremente, não tomar decisões políticas, mas que fazem parte do todo que votou e exprimiu uma opinião nas eleições.

Por arrasto, esta seria uma forma de diminuir o número de deputados (que actualmente está fixado no máximo legal de 230, remetendo-o para um valor justo e mais representativo da realidade nacional) e, por conseguinte, diminuir custos que se revelam por demais exagerados e, portanto, prescindíveis. Além de tudo isto, este sistema fomentaria um maior empenho por parte dos partidos políticos na selecção dos seus deputados e candidatos para que pudessem ser “apelativos” na disputa dos votos da possível abstenção.

Em suma, sabemos que esta nossa proposta é, de certo modo, arrojada, mas vai de encontro àquilo que entendemos ser uma democracia mais eficaz e, sobretudo, representativa.